sexta-feira, 3 de junho de 2011

O DÉFICIT CRÔNICO E SUAS CONSEQUÊNCIAS SOBRE O FUTEBOL COLORADO

Há oito anos tenho a honra de integrar o Conselho Deliberativo do nosso Internacional. Qualquer torcedor daria muito – e muitos sócios deram e dão muito – por essa honra de integrar o mais prestigioso órgão da estrutura do Clube. Ser Conselheiro é possuir prestígio no seio da Nação Colorada; um prestígio cuja proporção custo-benefício é largamente superior até ao dos cargos de Presidente e Vice-Presidentes do Clube, pois o pesado fardo das responsabilidades que os acompanham é um preço frequentemente excessivo a ser pago pelo prestígio que conferem. Ser Conselheiro é ter prestígio entre milhões de Colorados ao pequeno custo de uma contribuição mensal no mesmo valor da mensalidade social e na participação nas reuniões em que a monotonia da análise do balancete do período raras vezes dá espaço a algum tema mais relevante, como a análise da parceria para o remodelamento do Beira-Rio. E a análise do balancete é um exercício de frustração: a cada reunião do Conselho, deparamo-nos com a mesma situação de déficit crônico a ser sanado, a cada ano, com a transação de algum dos nossos jovens valores. Nilmar foi vendido duas vezes; Pato saiu pelo valor da multa rescisória; antes deles foram Daniel Carvalho, Diogo Rincón, Fábio Rochenback e tantos outros. Mais recentemente, tornamo-nos especializados em buscar jovens talentos nas escolas de outros Clubes e faturar na revenda, como havíamos feito com Lúcio: assim foram Alex e Giuliano. Outros observadores mais atentos poderiam certamente acrescentar mais nomes a essa lista, mas o que importa não é lembrar dos que saíram, mas constatar que cada venda proporciona um breve alívio financeiro que o tempo trata de eliminar, até que volte a ser urgente uma nova transação: qualquer semelhança desse processo com a satisfação de um viciado, até a próxima dose, não é coincidência.

Estudo a legislação esportiva brasileira há tempo suficiente para não ficar surpreso com a constatação de que a venda periódica de atletas formados pelo Internacional é uma necessidade comum a todos os clubes brasileiros, fruto amargo do conluio dos interesses de um ministro do Esporte com a demagogia do Congresso Nacional. Mas não somos apenas vítimas de um processo: temos nossa própria cota de responsabilidade por nossos problemas financeiros.

Posso reconhecer como natural e sadio o déficit operacional resultante do descompasso entre nossas receitas correntes e os elevados gastos com a manutenção de nossas categorias de base, com a infraestrutura do Clube e com a Vice-Presidência de Futebol. Reconheço como natural e sadio o investimento de parte dos valores da transação de Lúcio para manter as categorias de base de onde veio Rochenback; de parte dos recursos da venda deste para propiciar o surgimento de Daniel, Diogo e Nilmar; e do dinheiro levantado por esses para viabilizar os que vêm a seguir; devo inclusive cumprimentar os responsáveis por identificar nomes como Alex, Giuliano, Damião e Oscar, cujos investimentos resultaram em títulos e dinheiro; mas não posso reconhecer como natural, nem sadio, o emprego da receita obtida com a transação de nossa “prata da Casa” para fazer apostas em jogadores de brilhante passado, mas em final de carreira; ou de biografia apagada; ou de rutilantes promessas em outros clubes que, ao chegar no Internacional, não mostram a que vieram. Reconheço como natural e sadia a contratação pontual de jogadores capazes de suprir carências em posições para as quais as nossas categorias de base – o verdadeiro “Celeiro de Ases” de que fala o nosso hino – não lograram revelar talentos merecedores de promoção ao grupo principal; não reconheço como natural, nem sadia, a política do “bastantão”; da contratação indiscriminada e sem critério de jogadores aos magotes, quase invariavelmente destinados a decepcionar o torcedor, num primeiro momento, e o Vice-Presidente de Finanças, até o final de seus contratos. Nesse contexto, os vultosos valores constantes no orçamento Colorado a título de “comissões” parecem acender uma luz de alarme quanto aos reais motivos de muitas contratações.

O destinatário dessa crítica não é a atual gestão, nem as anteriores; em pouco mais de uma década, já tivemos mudanças políticas suficientemente drásticas na condução do Internacional para perceber que essa prática remonta pelo menos à época em que o dinheiro da venda de Falcão foi desperdiçado na contratação de um punhado de mediocridades cujos nomes ninguém lembra. O problema é de procedimento, e esse procedimento não é novo. O presidente Giovanni Luigi aparentemente tentou romper esse ciclo vicioso quando contratou um gerente executivo conhecido pela austeridade na contenção dos gastos; por outro lado, o empilhamento de argentinos em nossa folha de pagamento (para não falar no esquecido colombiano Bustos), além do limite de jogadores estrangeiros admitidos pela CBF, parece mandar sinais contraditórios. Se o abandono do barco Colorado pelo timoneiro Aod Cunha é um indicativo de qual visão triunfou, essa crítica continuará atual por muito tempo...

Fernando Baptista Bolzoni
Conselheiro do SPORT CLUB INTERNACIONAL
Membro do MAIS INTER

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